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Número 11 - Agosto 2014
Do enunciado a escuta, do sujeito ao objeto:
a sujeição do infantil frente ao poder do discurso médico
Daniela Trevisan Monteiro y Marcos Pippi de Medeirosz

 

RESUMO

Por inúmeras vezes na história a criança é descrita como um objeto, desprovida de desejo. A passagem da criança de objeto para sujeito dá-se com a evolução das ciências, o que, de certa forma, incentivou as legislações protetivas à criança. Assim, a infância é disputada por diferentes poderes: a medicina, a psicologia e o direito. O cuidado com a criança vai além da família e da escola e torna-se alvo do discurso médico-psicológico infantil. O saber científico e a ciência psicológica são requisitados para estabelecer os preceitos que dão início à condução da vida do sujeito e resolução de seus conflitos. O desenvolvimento da psicanálise infantil surge para reconhecer a singularidade da criança. Sendo assim, a reinscrição da criança no campo discursivo acontece pelo entendimento clínico de sua subjetividade. Em contrapartida, a relação da criança com a medicina fica atrelada a uma análise breve e a um diagnóstico precoce dos “transtornos”. A normalidade e a patologia são assim detectadas e distinguidas, possibilitando o diagnóstico. A escolha do tema desta pesquisa ocorreu principalmente pela inquietação perante a percepção do discurso médico frente a seu paciente infantil; onde a cientificidade e onipotência desse discurso não possuem lugar no simbólico da criança e, muitas vezes, também não toma lugar algum, a não ser para o próprio médico que o enuncia. Dessa forma, o objetivo geral desta pesquisa é voltado à percepção do lugar do infantil frente ao discurso médico. Essa percepção dar-se-á através de um estudo bibliográfico sob orientação psicanalítica.

Palavras-chave: Discurso médico, criança, psicanálise.

 

ABSTRACT

For several times in the history, the child is described as an object, unprovided of desire. The passage of child from object to subject happens with the evolution of the sciences, that, in this way, had incentived the legislations to protect the children. Thus, the childhood is disputed for different authorities: medicine, psychology and law. The care with the child goes beyond the family and the school, and turn an objective of the childish medical-psychological discourse. The scientific knowledge and the psychological science are required to establish the rules that start the conduction of the subject’s life and the resolution of their conflicts. The development of the childish psychoanalysis appears to recognize the singularity of the child. So, the reinscription of the child in the discursive field happens by the clinical understanding of this subjectivity. In another hand, the relation of the child with the medicine stays linked to a brief analysis and to a premature diagnosis of the “perturbations”. The normality and the pathology are detected and distinguished, what makes the diagnosis possible. The choice of the theme of this research occurred, specially, for the worry in the presence of the medical discourse in front of this childish patient, where the scientific content and the omnipotence don’t have place in the symbolic of the child and, many times, don’t take any place, but to the physician, that announces the pathology. Then, the general objective of this research is turned to the perception of the child’s place in front of the medical discourse. This perception will happen through a bibliographical study of psychoanalytical orientation.

Key-words: medical discourse, child, psychoanalysis.

 

RESUMÉE

Plusieurs fois dans l’histoire l’enfant est décrit comme un objet, sans désir. Le passage de l’enfant vu comme un objet à sujet se passe lors de l’évolution des sciences, ce que, d’une certaine façon, a motivé les législations de protections aux enfants. Ainsi, l’enfance est disputée pour des différents povoirs: la medicine, la psychologie et le droit. Les soins des enfants vont plus loin de la famille et de l’école et deviennent le cible du discours médical-psychologue d’enfant. Le savoir scientifique et la science psychologuique sont demandés à fin d’établir les règles qui font commencer la conduction de la vie du sujet et de la résolution des ses conflits. Le développement de la psychanalyse d’enfant est apparue pour reconnaître la singularité de l’enfant. Comme ça, l’inclusion de l’enfant sur le champs discursif se passe par la compréhension clinique de sa subjectivité. D’un autre côté, le rapport entre l’enfant et la médicine est lié à une brèf analyse et au précoce diagnostique des “bouleversements”. La normalité et la phathologie sont alors detectées et distinguées, en permettant le diagnostique. La choix du thème de cette recherche s’est donnée surtout par l’inquietation devant la perception du discours medical face à ses enfants patients, où la scientificité et onipotence de ce discours ne possedent pas lieu chez le symbolique de l’enfant et, plusieurs fois, ne prennent leur place que pour le docteur que l’annonce. Ainsi, le cible de cette recherche est versé à la perception du lieu de l’enfant face au discours medical. Cette perception se donnera à travers d’un étude bibliographique sous orientation psychanalitique.

 

Mots clés: Discours medical, enfant, psychanalyse.


 

 

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

METODOLOGIA

DESENVOLVIMENTO

  1. O Discurso Médico: Supremacia da Cientificidade Sobre o Sujeito.
  2. A Infância Sob o Discurso.
  3.  A Psicanálise Através do Discurso e os Discursos na Psicanálise.

CONSIDERAÇÕES FINAIS.

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO .


INTRODUÇÃO

Se regressarmos na história podemos observar a infância retratada em um lugar periférico. A falta de proteção à criança aumenta as probabilidades de abandono, atos comuns de infanticídio e abusos físicos e sexuais, denunciando a sujeição desta à sua própria sorte.
A invenção da infância provida de cuidados, proteção e afetividade é algo recente. Ao longo dos séculos o sentimento da infância foi se apresentando até chegar à forma de hoje. Na cultura medieval, até século XI, não havia uma representação da infância, algo que pudesse separar a criança do adulto; elas eram representadas com o mesmo tipo de corpo do adulto – “adulto em miniatura”. Não se reconhecia o espaço do infantil como um espaço diferenciado. Parte-se do pressuposto da existência de um mundo onde a representação da infância é desconhecida. Entre os adultos, a imagem da criança não era objeto de observação ou interesse. A baixa expectativa de vida e o nível intenso de mortalidade infantil contribuíam para que uma representação da infância fosse constituída apenas mais tarde. A criança participava do mundo dos adultos e a sua sexualidade não era reconhecida, o que as induzia a participar das brincadeiras sexuais dos adultos. Não havia problematização de reconhecer a sexualidade na criança; ela estava ali, de certa forma, como objeto de divertimento dos adultos.

A partir do século XII, surgem as primeiras representações da infância advindas da cultura religiosa através dos “anjos adolescentes”; essas representações compreendem a terceira infância, ou seja, crianças a partir dos dez anos. No século XIII, as crianças eram representadas sem sexo, mais propriamente, apresentando a imortalidade da alma. As primeiras representações de crianças em suas proporções normais surgem com a imagem da Virgem Maria e o menino Jesus. O cristianismo traz a representação da infância através da infância de Jesus (1).

O surgimento da percepção da existência da infância, no decorrer do século XIII, não significa melhores condições de vida para a criança. Na tradição portuguesa as crianças abandonadas tornavam-se objetos de caridade na “Roda dos Expostos” ou nas Casas de Misericórdias. As crianças expostas, por assim dizer, eram rejeitadas pelas suas mães, expostas na sociedade e postas “na caridade”. O abandono garantia o anonimato de moças que engravidavam antes do casamento e protegia a moral da família. A pobreza, doença do pai ou da mãe, bebês doentes ou deficientes e pais não casados também eram causas do abandono. Nas Casas da Roda, um terço das crianças abandonadas não completavam sete anos, devido à alta taxa de mortalidade infantil. A criança abandonada pelo mecanismo da roda era destinada à categoria de excluída, marginalizada, com dificuldades para a construção de sua identidade e desenvolvimento saudável (2).

A construção histórica da infância no Brasil inicia-se no povoamento do Brasil Colônia. As crianças vindas nos navios portugueses tinham como origem o abandono; provinham de famílias pobres, eram órfãos ou expostos ou ainda crianças judias seqüestradas.
No ambiente limitado do navio era preservada a ordem. As crianças eram os serviçais, os objetos sexuais e também substituíam os adultos no trabalho. A alimentação era restrita e os castigos corporais comuns. As crianças eram exploradas e adestradas para o trabalho. Servir e obedecer era a sua função.

No Brasil Império, por influência portuguesa, o abandono infantil é centralizado nas Casas da Roda. É nessa mesma época, também, que surge o uso da ciência para responder as disfunções da sociedade. Há uma “tomada de consciência” da gravidade do problema da mortalidade infantil. Inicia-se, então, uma preocupação acerca do valor da infância e da busca das causas da mortalidade; pois esta última passa a ser considerada como um problema de saúde pública.
Foi apenas em 1823 que a expressão “criança” surge pela primeira vez através da construção do Estado, nas discussões sobre a instrução e ensino aos moradores do Império. É a partir das primeiras instituições de ensino de nível superior que a infância ganha maior importância, principalmente na área da medicina. Esta assume os cuidados da criança através do conhecimento especializado e da higienização da família e da sociedade.
No período entre 1836 e 1870, das teses apresentadas na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, 81 eram voltadas ao tema da infância, com enfoque na prostituição infantil, freqüência escolar, higiene dos escravos, infanticídio e mortalidade infantil (3). É somente no início do século XIX que a preocupação com a infância abrange áreas não estudadas pela medicina, envolvendo outros setores sociais.
Juridicamente, as discussões iniciais sobre a infância perpassaram a limitação para a responsabilidade penal. Apenas muito mais adiante, a criança, a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente, deixa de ser um objeto e passa a ser considerada um sujeito que possui deveres e direitos (4).

Nota-se que, por inúmeras vezes, a criança é descrita como um objeto, desprovida de desejo. A passagem da criança de objeto para sujeito dá-se com a evolução das ciências, o que, de certa forma, incentivou as legislações protetivas à criança. Porém, é passível de questionamento se essa passagem ocorreu de fato. Pois, “falar uma criança” torna-se tarefa fácil e comum aos especialistas da infância, mas deixar falar uma criança ainda é ato ilusório no meio dessas ciências e desses “sábios” especialistas infantis. O lugar à infância é dado até o momento em que o lugar do adulto não é desacomodado. Ou seja, ainda hoje, não são reconhecidas certas particularidades da própria infância, deixando de lado tudo àquilo que produz incômodo aos adultos.
Na origem latina – infans, infantis, refere-se aos que não falam. Esse termo denota uma estrutura inacabada. Infantia possui referência com a falta de eloqüência, dificuldade em explicar-se. O termo infância vai além de uma condição orgânica de um estágio de aquisição da linguagem; demonstra, também, uma condição de submissão jurídica. Condição de um falante sem legitimidade ou reconhecimento social. Provindo da mesma raiz latina, o termo Infantaria aplica-se a soldados adestrados; enquanto que Infame, aos desonrados. Já o termo criança possui sua origem em creantia e se refere ao animal que está sendo criado. O caráter da criança a partir desse ato criativo de outro que a inventa proporciona o significado desta enquanto única e singular. Essa configuração importante coloca a condição de criança em um caráter de submissão a uma especularidade, a um estado de subordinação à alteridade (5).

A infância, então, é disputada por diferentes poderes: a medicina, a psicologia e o direito, colocando-a em uma zona limítrofe entre o público e o privado; produzindo controles e gerando saberes. O cuidado com a criança vai além da família e da escola e torna-se alvo do discurso médico-psicológico infantil. O saber científico e a ciência psicológica são requisitados para estabelecer os preceitos que dão início à condução da vida do sujeito e resolução de seus conflitos. Essa condição normalizadora encontra lugar principalmente na infância, onde o desenvolvimento encontra-se atrelado a condições externas. Nota-se, com isso, a desqualificação da família como agente autônomo, colocando-a na dependência de padrões externos autorgados pela ciência. O desenvolvimento da psicanálise infantil surge para reconhecer a singularidade da criança, mas ainda com indicações acerca da sua educação e para prevenir possíveis transtornos de conduta. Da criança desvendada a partir do atendimento clínico com o adulto à criança real trazida para a análise, encontra-se um vasto campo de atuação que, com o passar dos anos, possibilita um estudo mais aprofundado no que se refere à criança. Na psicanálise dá-se, com isso, a consolidação da psicanálise infantil realizada diretamente com essa faixa etária (6). Sendo assim, a reinscrição da criança no campo discursivo acontece pelo entendimento clínico de sua subjetividade.

A concepção psicanalítica infantil introduz um “cuidado” a partir da escuta, verbal e não-verbal, incitando a criança falar e desvendando seus conflitos; tendo por foco, um sujeito desejante. É inserida, assim, uma nova perspectiva onde se deixa de lado a determinação orgânica do discurso médico e abre-se espaço ao discurso do próprio sujeito.
Em contrapartida, a relação da criança com a medicina fica atrelada a uma análise breve e a um diagnóstico precoce dos “transtornos”. A “cientificidade médica” transforma, muitas vezes, o sujeito/criança em determinada doença/transtorno/objeto. A normalidade e a patologia são assim detectadas e distinguidas, possibilitando o diagnóstico.

Com todas estas questões, a escolha do tema desta pesquisa ocorreu a partir de quatro principais pontos. Em primeiro lugar, a inquietação perante a percepção do discurso médico frente a seu paciente infantil; onde a cientificidade e onipotência desse discurso não possuem lugar no simbólico da criança e, muitas vezes, também não toma lugar algum, a não ser para o próprio médico que o enuncia. A direção alienada desse discurso traz grandes prejuízos na comunicação médico-paciente, o que pode ser demonstrado, por exemplo, pela não adesão medicamentosa dos pacientes ou das famílias, quando se refere ao paciente infantil; ou também, pelo uso inadequado dos medicamentos receitados. Dessa forma, a não apropriação do discurso médico pelo paciente acaba por resultar na ineficácia do tratamento a ser seguido. Logo, para quem é dirigido esse discurso?
Em segundo lugar, a importância da especificidade mesma da psicanálise confrontada em sua relevância teórica e prática, por inúmeras vezes, interferindo em seu campo e em sua eficácia. Terceiro, pela própria criança, sujeito desejante,onde, ainda hoje, localiza-se para ela um lugar em que não traga risco real ou imaginário; sintomatizando-a e construindo um impasse entre sua importância enquanto sujeito em desenvolvimento e o mal-estar que se produz quando lhe é dado o poder do discurso. Em último lugar, surge esse tema como meio de uma construção de saber diferenciado do conceito infância e as formas “sujeitantes” das relações que ocorrem com esse infantil. É proposto aqui, demandar um olhar à criança, tirando-a de um lugar periférico e colocando-a no lugar de sujeito formado por subjetividade e desejo. É proposto parar e pensar, e colocar-se no lugar de ouvinte “dessas crianças que amamos demais” (7).

Sabe-se que, frente a todas essas questões colocadas abre-se um leque de possibilidades a serem discutidas. No entanto, o caminho percorrido nessa pesquisa volta-se, principalmente, para a sujeição do infantil frente ao poder do discurso médico. Percebendo que há uma lacuna que vai do enunciado a escuta, do sujeito ao objeto; pergunta-se: Como pode ser percebida a sujeição do infantil frente ao poder do discurso médico e que lugar real pode tomar esse infantil perante as múltiplas facetas desse discurso?
Com esta questão, proponho, dessa forma, o objetivo geral desta pesquisa voltado à percepção do lugar do infantil frente ao discurso médico. E coloco como os objetivos específicos: - a compreensão da importância de prover um lugar significante para a infância, a cargo disso, um lugar de sujeito suposto e de sujeito desejante em desenvolvimento; - o entendimento das conseqüências do discurso médico-científico frente ao paciente, e, por último - a promoção de um saber conceituado pelo viés psicanalítico acerca do discurso em sua suma importância.


METODOLOGIA

A pesquisa em questão constitui-se de um estudo bibliográfico. Pode ser considerado que este estudo possui orientação psicanalítica, sendo realizado assim, uma pesquisa teórica em psicanálise. A pesquisa em psicanálise pode ocorrer, de acordo com Violante (2000), na clínica, a partir desta, ou fora desta situação analítica; com o intuito que seu objeto de estudo seja passível de ser contemplado do ponto de vista psicanalítico e, ainda, pode considerada tanto uma pesquisa teórica como histórica. O principal é problematizar o objeto de estudo de tal forma que a psicanálise seja imprescindível para a elaboração da pesquisa.

Toda tese ou dissertação em psicanálise deve ser por si só pensada como um caso metodológico, que obtém seu percurso irredutivelmente singular. Esses estudos conservam em suas entrelinhas uma história, um processo que envolve conflitos, reviravoltas e resquícios de transferências com os autores estudados e com o orientador da pesquisa. Pode-se mencionar também a carga de ideais e fantasias colocados em um estudo como este, bem como o investimento de energia libidinal psíquica (8). Tal como relata Loureiro (9), escolher realizar uma pesquisa de caráter teórico vai além da leitura e interpretação de textos. Ao se deparar com um projeto teórico, o pesquisador possui em mãos um problema já inicialmente configurado, este, articulado com outras temáticas encontradas em conceitos da obra de tais ou quais autores que compreendem uma bibliografia inicial. Dessa forma, mesmo com a ausência de um referencial empírico, o pesquisador pensa e teoriza ao longo de todo processo, elaborando-o com mais clareza a partir do distanciamento de sua pesquisa, ou seja, retraçando seu percurso a posteriori.

Justifico meu interesse por um estudo teórico em psicanálise justamente pela maneira em que esta contempla o tema abordado. Procurei delinear os temas a partir do sentido que estes demonstram relevância teórica nessa discussão. Durante todo o desenvolvimento deste estudo a intenção foi mais de articular teorias e saberes do que propriamente achar respostas e solucionar problemas. A inquietude frente à impropriedade de um discurso foi fator decisivo nesse estudo e, mais ainda, meio de discussão e construção de novos conceitos.

3. DESENVOLVIMENTO

3.1 O DISCURSO MÉDICO: SUPREMACIA DA CIENTIFICIDADE SOBRE O SUJEITO

Sinto-me a vontade de iniciar essa discussão com uma pergunta: Qual o desejo do médico na relação com seu paciente? Jean Clavreul (10) sabiamente respondeu: O desejo do médico é definido pelo objeto da medicina e o objeto da medicina é a doença. A percepção do médico frente ao seu paciente parece seguir certa linha de descobertas. Primeiramente o médico volta seu olhar para os sintomas do seu paciente, pois é com eles que poderá nomear que tipo de doença este está acometido, ou seja, definir o diagnóstico, e este já é o segundo passo. Com o diagnóstico esclarecido, passa-se para o terceiro passo, escolher e indicar ao seu paciente o tratamento mais adequado e eficaz para a sua doença, ou ainda, realizar possíveis encaminhamentos. Está pronto, a pesquisa médica foi realizada e garantirá um paciente organicamente mais saudável. A formação médica é constituída de forma que se realize o recalcamento de todo o desejo pessoal, deixando dessa forma as satisfações específicas do exercício da medicina e com isso, seu objeto.

Na história da medicina sempre houve a preferência dos médicos pelas discussões sobre a essência das doenças e sempre se deixou em segundo plano os estudos anatômicos e fisiológicos. Um médico, por exemplo, pode diagnosticar seu paciente apenas pelo relato de seus sintomas, não realizando um exame clínico, onde o contato do corpo do médico com o de seu paciente ocorre de fato. Dessa forma o paciente é um figurante que conta a sua história de sintomas. A partir do século XIX há um maior interesse pelo corpo do doente, isso porque é nesse período que ocorre a descoberta da importância da anatomia patológica. Porém pode-se dizer que o interesse não é pelo corpo em si, mas no que nele pode-se ler. O corpo é o lugar onde a doença se inscreve e é pela doença a qual ele porta que o médico se interessa. O que sobra, quando retirada à doença, é o corpo do paciente e este não é objeto de desejo dos médicos. Dessa maneira a medicina ignora o que faz a vida e a morte, o que constitui o desejo e o gozo (11).
Observamos, então, que o objeto de desejo do médico é a doença, porque esta o constitui. Porém, é pelo discurso médico que a doença é constituída como causa: no sentido de que é esta que é causa do sofrimento do doente e também é causa da intervenção médica. O doente, sujeito que se encontra em sofrimento, é suprimido enquanto sujeito; e é exatamente este o efeito do discurso médico. Parafraseando Lacan: “O discurso se suporta por um único sujeito” (12). Sujeito este que é o próprio que o enuncia, ou seja, o médico.

O discurso médico coloca o sujeito em um “não lugar”. O único lugar existente é o lugar da doença. Com isto, pode-se dizer que o discurso médico materializa o sujeito. Quando extinguida a doença, o ex-doente não é mais interesse do desejo do médico, mesmo que ele sofra apenas por não estar doente. O seu sentimento ou sofrimento é investigado apenas no sentido de encontrar a doença; quando encontrada e, conseqüentemente, tratada, o desejo do médico se esvai. O saber cientificista da medicina coloca o discurso do médico voltado para seu objeto de investigação – a doença, e não para o sujeito. É desta forma que o saber cientificista toma lugar pela linguagem, no enunciado de quem é “detentor” deste saber, mas é também por esta via que acontece a alienação do discurso médico. É um discurso que se volta para ninguém, e torna-se significante apenas para quem o enuncia. Então, do enunciado à escuta, obtém-se um longo e alienante caminho; tão alienante que podemos considerar a escuta diferente do enunciado. E, do sujeito ouvinte, uma transformação visível ao objeto – a doença.

O que parece ser mais incompreensível é justamente o fato de que ocorre, através do discurso médico, uma dicotomia entre o sujeito (paciente) e seu próprio corpo. Cabe aqui ressaltar que o ser humano é constituído por três registros. São eles: “a materialidade do corpo, a imagem do corpo e a palavra que se inscreve no corpo” (13). Segundo Betts (2002), esses registros se combinam de acordo com os modos de subjetividade oferecidos pela cultura e como são inseridos pela lógica imaginária e simbólica dos cuidados maternos. De acordo com a maneira que esse processo vai acontecendo para o sujeito, a combinação desses registros produzirá um sofrimento, ou seja, sintoma, que incidirá com maior ênfase sobre o corpo, imagem ou palavra. O modo pelo qual o sujeito se relaciona com seu corpo dar-se-á conforme os discursos dominantes na cultura. Esse autor entende por discurso aquilo que se organiza da comunicação nas relações do sujeito com as palavras e com os objetos. É o discurso que produz laço social. Porém o discurso médico está fundamentado na exclusão da subjetividade; pois, o saber que a ordem científica produz se pretende “universal, total e anônimo, depurado de qualquer rastro de subjetividade” (14). O anônimo do cientificismo ocasiona uma exclusão das representações do sujeito no simbólico, o que extingui sua relação com a palavra que marca sua subjetividade. O discurso médico reduz o sujeito à sua materialidade corporal; com pouco espaço para a palavra que invoca uma verdade subjetiva que possa ser reconhecida pelo outro. Reduzido o sujeito a essa materialidade, o discurso é voltado para o vazio. E é justamente nesse vazio que o médico realiza seu gozo. Gozo este que pode ser descrito pela palavra que o médico enuncia, composta de cientificismo e voltada para seu objeto de estudo. A realização dar-se-á no próprio enunciado e na onipotência de um discurso que erra principalmente pelo fato de não admitir o erro. Contemplando Clavreul: “O médico não fala e não intervém, senão enquanto é representante, o funcionário do discurso médico. Seu personagem deve se apagar diante da objetividade científica da qual é o garante” (15). Dessa forma,mesmo que a subjetividade do paciente seja importante na busca de pistas que auxiliem no descobrimento da doença, o objetivo específico do processo diagnóstico não é reconhecer o paciente em sua totalidade, mas, como dito anteriormente, identificar a localização da doença no corpo e dos fatores que a causaram. Nesse processo a subjetividade médica não possui lugar, tendo maior importância a sua qualificação técnica (16).

Com essa colocação pode-se imaginar que o médico é a única coisa que a medicina o permite ser: um meio, um corpo composto por saberes científicos e suprimido em sua subjetividade enquanto sujeito. Para tanto, imagina-se também que o discurso provindo de um corpo materializado cientificamente e suprimido subjetivamente não pode senão obter igualmente um discurso que exalta a objetividade cientifica frente à própria subjetividade de seu sujeito-paciente.
Para fechar, mas não encerrar, essa discussão ressalto a questão da relação médico-paciente, ou, melhor dizendo, a (in)existência da “relação médico-paciente”. Isso porque quando o paciente chega ao consultório médico, ele chega como um doente, e sairá como tal ou não. O objeto, como falado anteriormente, a doença, é o foco para a pesquisa do médico frente ao seu paciente. Logo, parece ser mais sensato falar de uma relação médico-doente ou, ainda mais audacioso, médico-doença; extinguindo assim, uma relação médico-paciente e clarificando a inexistência desta. Sendo justamente o discurso que produz laço social, e, considerando esse discurso alienado e composto apenas pela objetividade científica, pode-se também considerar que o laço entre médico e paciente é tão alienado a ponto de inexistir. Dessa forma, torna-se mais compreensível porque esse modo de apreensão da realidade é menos adequado quando não existe uma doença orgânica.

3.2 A INFÂNCIA SOB O DISCURSO

Falamos até então em um discurso médico que materializa o sujeito. Mas se considerarmos esse sujeito como sujeito infantil, então esse materialismo toma efeito devastador sobre esse pequeno ouvinte. Na infância, a insuficiência subjetiva permite, segundo Vorcaro (2004), o efeito da potencialidade depositada pelos adultos. Efeito esse que surge através do discurso. Temos, então, um impasse, pois o discurso médico é justamente aquele discurso que descarta a subjetividade do sujeito – é um discurso vazio; e, o discurso que deve ser voltado à infância é o discurso que potencializa a sua subjetividade.

“O sujeito é criado pela linguagem, e não ao contrário” (17). Existe um ato de linguagem no ser humano porque existe um desejo, repressão e aparelho psíquico. Diferente do animal que age através de seus instintos próprios da espécie, o corpo do humano age através do ato da linguagem, a partir de como essa o inscreve como sujeito. O corpo do animal não pode aproximar-se ao corpo de um humano, no entanto o corpo de um humano pode aproximar-se ao corpo de um animal. Exemplo disso dado pelas crianças criadas por animais, chamadas crianças “lobos” ou “selvagens” (18). A inexistência da linguagem torna impossibilitada a constituição de um sujeito. Essa impossibilidade dá-se justamente porque o ‘eu’ se constitui inicialmente por uma experiência de linguagem (19). O ‘eu’ aqui referido é, segundo Lacan (20), um termo verbal apreendido em referência ao outro, que é uma referência falada. Dessa forma, pode-se dizer que o eu nasce em referência ao ‘tu’ (Outro). Essa referência dá-se através da relação com o outro e o que ele manifesta para a criança: ordens, desejos, que ela deve reconhecer dos pais ou outros de sua relação.

Sendo o ser humano deficiente em instinto, nada em seu sistema genético-fisiológico acha o objeto capaz de aliviar seu mal-estar. Diferente de outras espécies, o bebê humano fica exposto às suas necessidades sem ter recursos biológicos satisfatórios para definir como satisfazê-las. Quando o mal-estar provém de estímulos externos, uma ação é suficiente para evitar seus efeitos. Por outro lado, quando se refere a estímulos internos, a criança não possui recursos e somente terá uma resolução a partir de outro ser humano tutelar. Por esse motivo o objeto humano é constituído pelo Outro. O campo de alteridade do objeto é definido pela alienação do sujeito a respeito dele. O objeto no imaginário é idealizado, e no real torna-se impossível. Em seu lugar, para representá-lo surge o significante (21).

Segundo Jeruzalinsky (1999), é através do significante que se opera no desejo. Para que o desejo possa se constituir, o Outro precisa colocar em jogo uma marca que aliene o sujeito de seu objeto. Tal marca surge na ordem da linguagem, e falamos aqui não de uma linguagem como função psicológica, mas sim uma linguagem que captura o sujeito e o situa em relação à cultura. A primeira linguagem dá-se para o bebê através da relação com sua mãe. O bebê humano nasce em um estado de prematuração específica (22). Para tanto, resta a ele submeter-se àquele que toma para si os cuidados necessários para sua sobrevivência, o que realiza a função materna.
De acordo com Checchinatto (1988) citado por Mariotto (2005), a função materna ocorre em dois registros. O primeiro da necessidade e, o segundo, do desejo. Ou seja, a dependência entre a mãe e seu bebê acontece tanto no plano biológico, nos cuidados corporais necessários, quanto no plano simbólico. A prematuridade do bebê denota sua dependência a alguém que deve servir de suporte simbólico para este. Sendo assim, suas necessidades serão satisfeitas de acordo com o código simbólico da mãe, onde esta não proporciona apenas alimento, mas também palavras.

A criança começa a tornar-se sujeito através da demanda que a sua mãe lhe gera. Quando a criança chora, a mãe entende por esse choro um chamado, e, com seu poder onipotente sobre seu filho supõe seu desejo. Sendo assim, o sujeito que é colocado para o bebê, é um sujeito suposto, ou seja, pode ser considerado um sujeito em potencial que pode ou não tornar-se sujeito de fato. O olhar da mãe para seu bebê, apesar da indiferenciação inicial, deve supor um outro, diferenciado dela própria; e, ao mesmo tempo em que ela supõe, também duvida dessa suposição. Assim, o bebê pode confirmar sua suposição e ser demandante de sua mãe (23). Dessa forma, toda a interferência materna encontra-se inscrita na tradução em palavras das ações do bebê. A efetuação da função da mãe sobre seu bebê baseia-se no desejo inconsciente, para tanto, o bebê está para sua mãe enquanto signo deste desejo (24)

O fato de a mãe supor o desejo para seu bebê e supô-lo como um outro é parte para que ele se torne sujeito. Porém, o processo de subjetivação ocorre com outros acontecimentos fundamentais. Além da suposição de um sujeito realizada pela mãe e do estabelecimento da demanda da criança, é necessária a alternância presença-ausência e a entrada de um terceiro na relação entre mãe e bebê. Todos estes acontecimentos vão permitir o processo pelo qual o bebê-sujeito, visitado pela linguagem, vai ter seu corpo e sua subjetividade. É dessa forma que o nascer subjetivamente não é apenas um ato fisiológico. Para que a construção da subjetividade do bebê ocorra de fato, ou seja, torne-se um ser de linguagem, é preciso que alguém introduza nele outro registro – o discurso (25). Para tanto, o que é chamado de sujeito e referido até este momento, é o sujeito que fala.

De acordo com Sucupira (2000), é através da linguagem que a criança que não fala aparece como sujeito que se situa em um discurso. Esse discurso, de onde surge o sujeito, e como dito anteriormente, está presente desde o nascimento. Portanto é um discurso familiar que se encontra em determinada cultura. É esse discurso que preexiste no sujeito e que vai constituí-lo; ou seja, o sujeito se situa a partir de seu discurso, mas não o constitui, e sim é constituído por ele. O discurso, ao qual tanto me refiro e, segundo essa mesma autora, é a linguagem. Esta é constituída por uma rede de discretos elementos articulados, que são os chamados significantes, que por si mesmo nada significam, porém produzem sentidos através dos significados, uma vez que são colocados em cadeia. Uma palavra isolada não obtém significado, no entanto passa a significar no momento em que é colocada em cadeia junto com outros significantes.

Considerando que o inconsciente é estruturado como uma linguagem, Vorcaro (2004) aborda que na teoria de Lacan a criança não possui insuficiência na linguagem, a respeito dos modos como esta se apresenta. O que existem são insuficiências subjetivas da criança que lhe proporcionam as condições para a circulação significante que ela pode possuir, no caminho lógico de sua estruturação e no aprisionamento aos impasses de enlaces que podem ser gerados.
O inconsciente é estruturado por sonhos, lapsos e chistes. O significante é produzido no lugar do Outro e através desse processo surge o sujeito do ser que ainda não possui a fala (26). A estruturação da fala na criança dá-se através da estruturação de seu inconsciente. Onde, no lugar de suas insuficiências subjetivas, formam-se novos significantes que permitem a entrada da criança no campo do discurso. O Outro é para o sujeito o lugar de sua causa significante e sem ele nenhum sujeito pode ser causa de si mesmo (27). Portanto, é justamente quando a mãe traduz em palavras as ações do bebê que ela vai introduzindo os significantes necessários para a sua inscrição na linguagem.

A criança se insere nesse discurso do outro, o que confirma sua entrada na linguagem. E é através do corpo e de seus movimentos que ela demonstra que ali existe um dizer, um sujeito. É esse dizer que o outro precisa ler e entender para que exista uma relação. Relação, como dito anteriormente, que se fundará no e pelo discurso do outro. Portanto, aí esta a importância do médico poder ouvir esse seu doente infantil e poder retornar para ele um discurso que seja constituído por subjetividade. Assim, considerando não apenas seu objeto de estudo, mas um sujeito em sofrimento, e sendo audacioso o suficiente para desenvolver uma relação direta com esse sujeito. Talvez esteja justamente aí a forma mais eficaz da mesma terapêutica que é prescrita na inexistência da relação médico-doente demonstrar melhor eficácia agora na existência da possível relação médico-paciente. Falta ao médico uma percepção de seu paciente e falta a eles despir-se de um saber maciço e permitir (não sem sofrimento) enxergar-se junto ao seu paciente.

3.3. A PSICANÁLISE ATRAVÉS DO DISCURSO E OS DISCURSOS NA PSICANÁLISE

Quer se pretenda agente de cura, de formação ou de sondagem, a psicanálise dispõe de apenas um meio: a fala do paciente. A evidência desse fato não justifica que se o negligencie. Ora, toda fala pede uma resposta (LACAN, 1998, p. 248).

Toda a fala obtém a sua resposta, desde que ela possua um ouvinte, e é essa a função na análise. É pelo e no discurso que a psicanálise atua. Ela utiliza a fala como meio através do que esta confere de sentido do sujeito; utiliza o discurso concreto (28) como campo da realidade do sujeito; e utiliza a história como operação no que ela constitui da verdade no real (29).

O terapeuta analisa o comportamento do paciente para encontrar o que ele não diz e, a partir daí, ele recupera a palavra, no sentido de fazer com que o sujeito fale sobre isso. O papel do psicanalista é ouvir que parte do discurso do paciente é confiado o termo significativo. Ele (o psicanalista) toma o relato de uma história cotidiana por um apólogo; uma prosopopéia por uma interjeição direta, um pequeno lapso por uma grande declaração, ou o silêncio por todo o desenvolvimento que ele suprimi (30). Para tanto, é justamente uma pontuação oportuna que trará sentido ao discurso do sujeito.
A psicanálise observa o sujeito além de um corpo físico. Dessa forma, o saber psicanalítico vira-se a um sujeito desejante e que se encontra em sofrimento. Quando o sujeito procura um médico, ele procura algo que alivie seu sofrimento físico, porém mesmo com o tratamento médico correto, as significações dadas pelo sujeito a respeito do tratamento e de sua doença podem ser variadas. Segundo Sibemberg (1997), é importante ressaltar que o ato do médico ao prescrever um fármaco para seu paciente constitui-se como um ato de fala em transferência, onde aquilo que o paciente escuta vem desde outro lugar daquele que enuncia. Ademais:

A mensagem enunciada pelo médico é escutada através da mediação do Outro. A escuta não responde de forma direta à intencionalidade do eu do enunciado, o que muitas vezes motiva a queixa médica de que alguns pacientes não obedecem suas indicações terapêuticas. A mensagem será recebida de maneira invertida por aquele que formula a demanda, ou seja, seu destino não é o eu do enunciado, mas as condições da enunciação, lugar do sintoma enquanto estruturante do sujeito. Assim, os efeitos significantes desse ato de fala dependem, no campo da saúde-doença, das metáforas veiculadas no discurso social, da forma como a castração estrutura o sujeito demandante e, no caso da clínica de crianças com transtornos do desenvolvimento, das repercussões subjetivas que a patologia do filho opera no desejo dos pais (SIBEMBERG, 1997, p. 48-49).

Diferente da clínica médica, onde há um determinismo entre os sintomas e o diagnóstico, na psicanálise a causalidade psíquica não permite que se obtenha uma relação estável entre ambos. A terapêutica do analista é justamente a escuta, sustentada no discurso do paciente (31). E, justamente por essa sustentação que o discurso psicanalista se diferencia do discurso médico. Isso porque o discurso médico reduz as desordens da subjetividade integrando-as em sua própria ordem – a ordem médica. Para tanto, Clavreul (1983) realiza um estudo a respeito dos “quatro discursos” de Lacan, bem como o que este autor entende por discurso. E, para ficar mais claro as diferenças entre esses discursos até aqui referidos, me ocuparei dessa análise a fim de demonstrar uma leitura psicanalítica do modelo do discurso médico.

Lacan, em sua análise lingüística, teoriza que o significante só possui sentido quando encontrado na cadeia de significantes. O que representa o significante é o sujeito e a representação desse sujeito possui seu lugar apenas quando reunido a outros significantes. É somente no discurso em que o significante está incluído que terá a sua significação, para tanto isso depende do enunciado, da escolha do significante dentro da cadeia dos significantes. Mas o sujeito não o é apenas enquanto enunciado e enunciação; ou seja, o sujeito se encontra em uma relação dupla onde há tanto uma relação com a cadeia significante quanto uma relação com o objeto (“objeto a”) (32) . O discurso contempla tanto o sujeito ($), quanto sua relação com o objeto (“objeto a”) e está inserido na cadeia significante (S1, S2, S3, S4, etc.). Sendo que o significante S1 representa o sujeito e a cadeia significante (S2) remete ao sistema organizado, ou seja, o discurso.

Essa demonstração realizada acima vem com o intuito de demonstrar os quatro elementos fundamentas do discurso: o sujeito ($), o significante (S1), a cadeia significante (S2) e o objeto (“objeto a”). Cada um destes encontram-se em relação com dois outros elementos, assim, constituindo relações recíprocas. São estes quatro elementos que permitem caracterizar os quatro discursos. São eles: o discurso do mestre, o discurso do universitário, o discurso da histérica e o discurso do analista. Cabe aqui ressaltar que nenhum destes se mantém sem a existência dos outros três, bem como um discurso não possui supremacia em relação ao outro e não há entre eles aquele que possa ser considerado ideal.

O primeiro discurso é o Discurso do mestre. E é deste que o discurso médico mais se aproxima. Este tipo de discurso utiliza os signos como fonte de informação sobre a doença. Porém é somente através do médico que o signo se torna realmente informação, pois é este (o médico) que o coloca em relação com os outros signos, onde reunidos formam a síndrome que pode ser atribuída a uma doença. Dessa forma, é através do conhecimento que o médico poderá supor uma ordem possível desses signos, utilizando-os dentro de uma cadeia significante. É por este discurso que se torna viável a constituição dos signos em significantes e; destes, uma significação; ou seja, a existência de uma doença.

O resultado desse tipo de discurso está no fato de que ele incide da subjetividade de quem o enuncia, assim, a objetividade do cientista dá-se pela subjetividade do autor. Isso não significa que não há subjetividade, mas que ela não possui importância alguma na enunciação do discurso. Assim, o discurso médico possui a sua força justamente no fato de existir independentemente da subjetividade de quem o enuncia ou de quem o escuta.

O discurso do mestre/médico possui como alvitre um único objeto que é a doença. É por essa via que se constitui o gozo no saber cientificista, no sentido de que é através da ordem no discurso que o objeto – a doença, vai aparecer. Assim, o objeto desaparece na sua relação direta com o Sujeito ($) enquanto objeto da fantasia (como causa do desejo), e irá reaparecer como achado no discurso. Para tanto, qualquer descoberta científica, como o diagnóstico, por exemplo, elimina a divisão do sujeito. E, segundo Clavreul: “o desejo do médico por seu objeto é unificador (dos médicos entre si, mas também do médico para consigo mesmo)” (33).

O segundo discurso, ou o Discurso do universitário, é o discurso estabelecido como saber. Este é o discurso da universidade em que se transmite o saber arrecadado junto aos mestres. São os professores que lêem os mestres ou transcrições destes. Assim o saber é retransmitido de forma parcial e após ter passado por uma deterioração. Os significantes são recolhidos e organizados, sem que nenhum se sobressaia ao outro, apenas inserindo um novo significante na medida em que este se acomoda à ordem de um discurso já estabelecido. Desta forma, a universidade opera com obstáculos a novos significantes se estes virem a destruir a ordem anteriormente constituída. O saber formado torna-se, também, uma limitação em consideração ao que não se inscreve nesse saber.

O que se caracteriza nesse discurso é que o saber é visto enquanto tal e não em sua relação com os significantes que o compõem. Portanto, o saber encontra-se em relação direta com os bens de gozo, e o gozo dos bens que o saber alcança. Logo, podemos distinguir “o discurso do mestre como produtor do saber e o discurso do universitário como detentor desse saber” (34). Assim, o saber médico se justifica através das intervenções terapêuticas que se traduz pelo medicamento. E, considerando que todo o saber nos constitui como divididos (divisão do sujeito em relação aos bens produzidos pela ciência), o saber médico divide o doente em homem e doença.
Como o terceiro discurso, temos o Discurso da histérica, que traz a divisão do sujeito em primeiro lugar, este aparece através da patologia. É no discurso médico que se caracteriza o discurso cientifico típico e a histeria foi reconhecida através dele, no que ela é em relação ao saber médico. A histeria se assemelha a todas as doenças sem ser uma delas, por esse motivo esquiva-se ao saber constituído. Dessa forma, diferentes tipos de tratamentos podem curá-la e tratamentos mais comuns podem falhar; o que deixa claro que na histeria os sintomas remetem ao próprio sujeito em degradação ao discurso médico.

A histérica significa-se em sua subjetividade através dos sintomas. Esses sintomas são significantes em relação à cadeia significante, não constituindo uma ligação ordenada, como no discurso do mestre, por exemplo. Dessa forma, considera-se que as histéricas são teóricas. O lugar destinado às histéricas é justamente aquele em que o discurso torna-se mais problemático, visando produzir saber, criando uma cadeia significante. O discurso da histérica é remetido a ela mesma e a sua subjetividade.
O quarto discurso é o Discurso do analista. Ele coloca o ‘objeto a’ em primeiro lugar inscrevendo sua relação com o Sujeito. Dessa forma, a psicanálise demonstra a fantasia na relação entre o Sujeito e o ‘objeto a’; e é o ‘objeto a’ que é o objeto primeiro de desejo. Assim, a interdição coloca o Sujeito em posição de procura a outro objeto, ou seja, um objeto substitutivo. Portanto, é pela fantasia que o sujeito se articula.
Com os quatro discursos colocados, pode-se inferir que a posição do médico provém de cada um deles. No discurso do mestre encontram-se o diagnóstico, o prognóstico e a pesquisa médica, na sua busca de desvendar a doença. Em relação ao discurso do universitário, pode-se considerar o caminho entre o saber constituído da medicina e o tratamento oferecido em benefício ao doente. O fato de o médico ter que se colocar enquanto médico, ou seja, quem possui o saber, o insere no discurso da histérica. E ele se sustentará na posição do analista justamente quando supor que seu paciente deseja outra coisa diferente do que se oferecer ao discurso médico o que o fará proporcionar uma escuta diferenciada. Mas para isso, ele deixará de ser médico e precisará se colocar em uma posição oposta da medicina; irá permitir que um pouco de subjetividade se apresente nessa relação vazia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tive a pretensão abordar três eixos principais na minha discussão sobre o Discurso: o discurso médico em si, considerando as suas particularidades; a psicanálise, que possui sua existência no discurso; e a criança, vista por esses diferentes discursos e colocada em diferentes lugares. Através desses eixos principais acredito ter demonstrado que, mesmo hoje, a criança ocupa um lugar periférico dentro do discurso do Outro, e ainda, muitas vezes, é colocada como objeto. Aqui me remeto ao título da pesquisa: ...do sujeito ao objeto: a sujeição do infantil frente ao poder do discurso médico..., com o intuito de revelar o quanto a criança vira objeto dentro do discurso e o quanto ela está sujeitada nesse discurso. Dito de maneira sucinta, a criança não possui seu espaço.
Observa-se no decorrer do estudo que, em relação à psicanálise, “a história já se faz no palco em que será encenada depois de escrita, no foro íntimo e no foro externo” (35) É na direção da subjetividade que ela ocorre. Através da subjetividade ali colocada em cena na relação analista-paciente que este último terá condições de reconhecer o seu inconsciente como a sua história. Em relação à criança, particularmente, no momento em que há a afirmação de que nela existe um inconsciente, então a psicanálise vê ali um sujeito. Considerando a criança como um sujeito, então se considera o discurso, com este, os desejos, as emoções, a subjetividade em si. Em outras palavras, a psicanálise em sua especificidade acontece no e pelo discurso.
Já em relação ao discurso médico, há um saber que opera no real, ou seja, no real do corpo, da doença, da dor. Mas no jogo transferencial entre o médico e seu paciente, ambos os corpos devem ser colocados no discurso. Na pretensão médica do saber total cria-se um impasse onde se coloca de lado tudo o que se refere à subjetividade, e ambos os corpos tornam-se vazios, vistos pelo olhar estrábico do cientificismo. O discurso, tão importante no ato terapêutico e, nesse caso, no ato de cura, é ecoado para ninguém. Na academia ensina-se aos residentes a direção da cura e formam-se ótimos médicos, porém, pecam no objeto de estudo e, a partir daí, pecam justamente por dicotomizar esse objeto – a doença do sujeito doente. E, no momento em que o discurso médico é enunciado, já não se pode mais referir-se como sujeito doente porque este perde a sua subjetividade, torna-se um corpo vazio onde ali habita apenas a doença que ganha nome e tratamento específico.

Com isso, refiro-me a criança e ao seu desenvolvimento, onde os transtornos alimentares, excrementícios, mictórios, os vômitos, as febres recorrentes sem explicações médicas e associadas a quadros emocionais, demonstram o quanto o corpo da criança é capturado pelas determinações simbólicas; que se expressam pelos sintomas psíquicos ao mesmo tempo em que se contestam à função fisiologia do órgão. Essa cadeia significante que captura o corpo da criança pede um olhar, uma escuta do Outro que o constitua (36). Na infância, o desenvolvimento não é operado apenas por automatismos biológicos. Pode-se considerar, então, que no discurso do sujeito ela é mais falada do que fala, e no discurso do médico não é permitido a ela falar.
Assim, fica aqui colocado a maior falha em uma consulta entre médico e doente: o Discurso. Junto deste, toda a alienação que um discurso vazio é capaz de abranger. Com essa problemática, abre-se à possibilidade de perceber a importância que possui o discurso do outro, à proporção que terá a relação médico-paciente quando ambos se colocam ali, um para o outro, considerando as subjetividades existentes nesse campo onde se insere o discurso. E, por fim, a importância de um olhar diferenciado à criança, ao seu desenvolvimento e a sua subjetividade.

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_________________. A criança na clínica psicanalítica. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2004, p. 22 a 24.

NOTAS

(1) ARIÈS, Phillipe. História Social da Criança e da Família. 2 ed. Rio de Janeiro: LTC. 1981. Traduzido por Dora FlaKsman. Titulo original: L’enfant et la Vie familiale sous l’Ancien.

(2) MARCÍLIO, Maria Luiza. História Social da Criança Abandonada. São Paulo: HUCITEC, 1998.

(3) FREITAS, Marcos Cezar de (org.).  História Social da Infância no Brasil. 2.ed. São Paulo: Cortez, 1997, p. 58 e 61.

(4) Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (ECA). Lei Federal n. 8.069/1990. Pallolli,  Santa Maria – RS, 2003.

(5) VORCARO, Angela M. R. A criança na clínica psicanalítica. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2004, p. 22 a 24.

(6) ABRÃO, Jorge Luís Ferreira. A história da psicanálise de crianças no Brasil. São Paulo: Escuta, 2001.

(7) Expressão retirada do livro de: CALLIGARIS, Contardo. Crônicas do Individualismo Cotidiano. Atica: São Paulo, 1996.

(8) LOUREIRO, Ines. Sobre algumas disposições metodológicas... In: Pesquisa em Psicopatologia Fundamental / Edilene Freire de Queiroz e Antonio Ricardo R. da Silva (orgs) – São Paulo: Escuta, 2002.

(9) Idem.

(10) CLAVREUL, Jean. A ordem médica: poder e impotência do discurso médico. São Paulo: Brasiliense, 1983.

(11) Idem.

(12) Lacan, citado por Clavreul (idem 8), p. 119.

(13) DIDIER-WEILL, A. Nota azul – Freud, Lacan e a arte. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1997. Citado por BETTS, Jaime. Parecer ou não ser, eis a questão. In: Seminários Espetaculares. Porto Alegre: Corag, 2002. p. 141.

(14) BETTS, Jaime. Parecer ou não ser, eis a questão. In: Seminários Espetaculares. Porto Alegre: Corag, 2002, p. 142.

(15) CLAVREUL, James. A ordem médica: poder e impotência do discurso médico. São Paulo: Brasiliense, 1983, p. 224.

(16) SUCUPIRA, Ana Cecilia Silveira Lins (coord.)... [et al.]... Pediatria em consultório. São Paulo: Sarvier, 2000.

(17) LEVIN, Esteban. A linguagem como constituinte do universo humano... e do humano no universo. In: A Clínica Psicomotora: o corpo na linguagem. 6. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995, p.78.

(18) Idem.

(19) LACAN, Jacques, 1901 – 1981. O seminário de Jacques Lacan. Livro 1: Os Escritos Técnicos de Freud. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.

(20) Idem.

(21) JERUZALINSKY, Alfredo. A formação da imagem corporal. In: Psicanálise e Desenvolvimento Infantil: um enfoque transdisciplinar. 2. ed. Trad. Diana Myriam Lichtenstein et alii. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999.

(22) LACAN,Jacques (1949). O estágio do espelho como formador da função do eu. In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. p. 100.

(23) LACAN, Jacques. O Seminário. Livro IV. A Relação de Objeto. Ed. Paidos, 1994.

(24) MARIOTTO, Rosa Maria M. Interpretação e Hermenêutica no Surgimento do Sujeito. In: Col. Franco-brasileiro sobre a clínica com bebês, 2005. Disponível em: <http//www.proceedings.scielo.br/scielo.php. Acesso em 31 aug. 2007.

(25) Idem.

(26) LACAN, Jacques (1949). Posição do Inconsciente. In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.

(27) Idem.

(28) Expressão de Lacan utilizada para designar o inconsciente como parte desse discurso concreto onde, falta à disposição do sujeito para manter a continuidade de seu discurso consciente. In: LACAN, Jacques, 1901 – 1981. Função e campo da fala e da linguagem. In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. Traduzido por Vera Ribeiro, tradução de: Écrits.

(29) LACAN, Jacques, 1901 – 1981. Função e campo da fala e da linguagem. In: Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. Traduzido por Vera Ribeiro, tradução de: Écrits.

(30) Idem.

(31) VORCARO, Ângela. Crianças na Psicanálise: clínica, instituição, laço social. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 1999.

(32) Este ligado ao sujeito através da fantasia, sendo esta a indicação de relação possível entre o Sujeito que discursa e o real de seu discurso que se constitui como realidade. Clavreul, p. 167.

(33) Clavreul, p.170.

(34) Idem, p. 171.

(35) Lacan. 1901 – 1981. Função e campo da fala e da linguagem. In:    Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998, p.262.

(36) JERUZALINSKY, Alfredo. Desenvolvimento e Psicanálise.. In: Psicanálise e Desenvolvimento Infantil. um enfoque transdisciplinar. 2. ed. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1999.

 

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